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sábado, 14 de abril de 2007

Silêncio

«O Silêncio... Falar do Silêncio. Sair do silêncio antes de voltar a entrar no silêncio... Alguma vez terei estado dentro dele?»

Quatro paredes... o único som audível o das teclas a baterem. O silêncio invade o espaço, prolonga-se no tempo. É ele que me invade ou sou eu quem entra dentro dele?

Não falo. Não penso. As letras escorrem à medida que os meus dedos vão tocando num teclado de cor negra... há quem diga que o negro é o tom do silêncio...

Penso, não, recuso-me a pensar. Pensar dói e a cabeça, ocupada por preocupações outras, não se pode dar ao luxo de trabalhar... As engrenagens começam a funcionar. Tento pará-las. Não consigo... Silêncio... Em tão pouco tempo o silêncio completo desaparece. Desaparece para mim. Tudo à minha volta é silêncio. Na minha cabeça ouço vozes... palavras... as palavras juntam-se. Maquinalmente. O silêncio... o meu silêncio é corrompido...

«Alguma vez terei estado dentro dele?». Não. Não estive. O silêncio não me abraça. As vozes não se calam. Penso, remexo, revolvo. Passado, presente e futuro cruzam-se e embrenham-se na minha cabeça... Mas o que é o passado? O presente? O futuro? Não sei, não os consigo isolar. A mescla entre eles torna-se demasiado complexa. Mais palavras, não, pessoas. Não, são palavras... «Palavras, palavras, palavras... a minha vida não foi senão isto...»

Passado... palavras... não, não é o passado, mas também não são palavras. Sons. São sons. Não, vultos que emitem sons. Imagens simulacrais. Não, são mesmo os protagonistas de uma longa história inacabada... a minha...

Presente... sim, se a história está inacabada é o presente. Mas, mais uma vez, também não... é a intersecção imperfeita entre passado e presente... um buraco, uma fenda, uma falha. Uma interrupção medeia os dois momento. Não me lembro... esforço-me... não consigo. «Já alguma vez tiveste um dia conseguido? E um minuto conseguido?» Tive-o... esse minuto, esse momento, esse breve sopro... todavia não o recordo... Palavras, Palavras, PALAVRAS... encho essa brecha com palavras... recordo «No princípio era o Verbo». Terei sido verbo ou passei directamente à carne? A dúvida... duvido... as questões... os embaraços... as reticências... uma porta fechada... Se está fechada é porque alguém a fechou. Quem terá a chave?

Procuro... não há chave, nem fechadura. Ela continua fechada, eu continuo aqui... Futuro? Como passar para o futuro... Se fosse realmente futuro estaria em aberto... Mas não... fechado... minto... não, fechado mesmo. Confirmo. Não posso confirmar, não posso afirmar nada. As palavras voltam a inundar-me como punhais... não... são dóceis... não, brasa. Queimam.... ardem... mutilam-me...

Corro, rapidamente... fujo... protecção... onde? Não há... Há... «Para onde vais Alice? Vou para o outro lado do espelho!» Salto, caio, ergo-me... volto a cair... rastejo, respiro, levanto-me e salto... Não é porta, é espelho... atravesso-o... nada... não ouço nada... não há nada... silêncio... entrei dentro dele...

«A virgula surgirá no ponto em que me afogar definitivamente e haverá Silêncio!»




Agradecimentos:
Lewis Carroll
Peter Handke
Samuel Beckett
S. João


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